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O Abuso do Direito de Defesa e o Uso Disfuncional do Processo: Consequências Jurídicas de Atitudes de Má-fé e Ato Ilícito

O Abuso do Direito de Defesa e o Uso Disfuncional do Processo: Consequências Jurídicas de Atitudes de Má-fé e Ato Ilícito

Por Henrique Parada

O processo judicial, essencial para a pacificação social e a solução de conflitos, deve ser conduzido conforme os princípios da boa-fé e da lealdade processual. A Constituição Federal, no artigo 5º, inciso LV, garante o contraditório e a ampla defesa a todos os litigantes, de modo que as partes possam apresentar seus argumentos e exercer seu direito de defesa. O Código de Processo Civil de 2015 (CPC), no artigo 6º, reitera esse princípio ao determinar que as partes devem cooperar entre si para que o processo alcance sua finalidade de forma eficiente e justa.

No entanto, o direito de defesa, assim como o direito de ação (art. 5º, XXXV, CF), pode ser utilizado de maneira abusiva, resultando em práticas que distorcem o objetivo do processo. José Carlos Barbosa Moreira ressalta que o abuso de direito “se caracteriza quando a parte, mesmo exercendo um direito formalmente legítimo, extrapola os limites impostos pela boa-fé e pela função social do processo” (A Garantia do Contraditório na Atividade de Instrução, 1984). Nesse sentido, quando o autor da ação age de maneira abusiva, buscando vantagens indevidas ou dificultando o andamento do processo, comete abuso do seu próprio direito de defesa.

Práticas como o fatiamento de ações, a distribuição de processos em comarcas indevidas, a apresentação de informações ou documentos falsos, além de configurarem má-fé processual (art. 80, CPC), podem ser enquadradas como atos ilícitos, conforme o artigo 187 do Código Civil. Este artigo tem como objetivo explorar essas práticas, discutir suas consequências jurídicas e indicar as medidas que podem ser tomadas contra o autor ou o advogado.

O Abuso do Direito de Defesa do Próprio Autor e o Uso Disfuncional do Processo

O abuso do direito de defesa não se limita às ações do réu, podendo ser cometido também pelo autor da demanda. Embora o autor esteja formalmente exercendo seu direito de ação, garantido pelo art. 5º, XXXV da Constituição, ele pode desvirtuar esse direito ao litigar de má-fé ou utilizar o processo de maneira disfuncional.

Segundo Luiz Guilherme Marinoni (Tutela da Urgência e Tutela da Evidência, 2021), “o direito de ação, quando utilizado com o objetivo de protelar o processo ou alcançar vantagem indevida, viola o princípio da boa-fé processual”. Marinoni destaca que o processo não pode ser visto como um campo de manobras estratégicas desleais, mas como um instrumento de realização da justiça.

Fatiamento de ações ocorre quando o autor divide artificialmente uma única causa em várias ações, com o intuito de sobrecarregar o Judiciário e dificultar a defesa da parte contrária. Essa prática afronta o princípio da economia processual, previsto no artigo 139, II, do CPC. Já a distribuição de processos em comarcas indevidas é uma tentativa do autor de retardar o processo ou obter uma decisão favorável em um foro que não tem competência territorial (art. 53, CPC).

Além disso, a apresentação de documentos falsos ou a indução de informações errôneas no processo viola o princípio da boa-fé (art. 5º, CPC) e pode configurar fraude processual (art. 80, CPC). Anderson Schreiber, em sua obra A Proibição de Comportamento Contraditório (2017), reforça que “o uso disfuncional do processo constitui uma forma de abuso de direito, pois desvirtua a finalidade da tutela jurisdicional e compromete a confiança nas decisões judiciais”. Essas práticas, quando utilizadas pelo autor, ultrapassam os limites do exercício legítimo do direito de defesa, transformando o processo em um instrumento de abuso, configurando, assim, o ato ilícito previsto no artigo 187 do Código Civil.

Consequências das Práticas Abusivas pelo Autor

O abuso do direito de defesa do próprio autor gera consequências jurídicas graves, uma vez que as práticas como o fatiamento de ações, a distribuição em comarcas indevidas e a indução de situações fáticas falsas vão além da mera litigância de má-fé.

Fatiamento de ações: Quando o autor fraciona a causa, ele provoca a multiplicação de processos desnecessários, gerando despesas adicionais e dificultando a defesa do réu. Além de caracterizar má-fé processual, conforme o artigo 80 do CPC, essa prática pode resultar na condenação do autor ao pagamento de multas processuais e indenizações, conforme o art. 81 do CPC.

Distribuição em comarca indevida: A tentativa de manipular a competência territorial para obter decisão favorável ou protelar o processo fere diretamente o art. 53 do CPC, que estabelece critérios claros de competência. Essa prática, além de gerar a remessa dos autos à comarca correta, pode resultar em condenação por má-fé e na necessidade de reparação de danos à parte contrária.

Apresentação de informações e documentos falsos: O uso de documentos falsificados ou a alegação de fatos inverídicos configura fraude processual, que é punível não só no âmbito civil, mas também no penal (art. 347, Código Penal). O autor que age dessa maneira está sujeito a indenizações por danos materiais e morais, além de ser enquadrado no art. 187 do Código Civil, que trata do exercício abusivo de direitos.

Aplicação do Artigo 187 do Código Civil: Ato Ilícito

O artigo 187 do Código Civil prevê que “comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. Aplicado ao processo judicial, isso significa que o autor, ao utilizar seu direito de ação de forma a prejudicar deliberadamente a parte contrária, comete um ato ilícito.

Segundo Daniel Mitidiero (Antecipação de Tutela, 2022), “a litigância abusiva ocorre quando o autor age de forma contrária à lealdade processual, utilizando-se do processo como um meio para obter vantagem desleal ou retardar a prestação jurisdicional”. Nesses casos, o autor é obrigado a reparar os danos causados à parte prejudicada, conforme o art. 927 do Código Civil, além de responder pelas sanções processuais previstas no art. 81 do CPC.

Consequências: Reconvenção, Pedido Contraposto e Ação Autônoma Contra o Advogado

Para combater as práticas abusivas do autor, a parte prejudicada dispõe de diversos mecanismos legais:

Reconvenção e pedido contraposto: A reconvenção (art. 343, CPC) permite ao réu, dentro da mesma ação, formular um pedido contra o autor, buscando a reparação pelos danos causados pelas práticas abusivas. Nos Juizados Especiais, o pedido contraposto (art. 31 da Lei 9.099/95) possibilita que a parte lesada obtenha compensação de maneira célere e eficaz.

Ação autônoma contra o advogado: Se a conduta abusiva for atribuída ao advogado, a parte lesada pode ajuizar uma ação autônoma contra ele, pedindo reparação civil pelos danos causados. O artigo 32 do Estatuto da OAB (Lei 8.906/94) responsabiliza o advogado pelos atos ilícitos que praticar no exercício da advocacia, prevendo inclusive sanções disciplinares no âmbito ético-profissional.

Essas medidas garantem que as práticas abusivas sejam reprimidas e que a parte prejudicada tenha meios de obter a reparação devida, além de assegurar a integridade do processo judicial.

Conclusão

As práticas abusivas cometidas pelo autor, como o fatiamento de ações, a distribuição de processos em comarcas indevidas e o uso de documentos falsos, configuram abuso do direito de defesa e uso disfuncional do processo. Tais condutas, além de comprometerem a boa-fé processual, resultam em ato ilícito, conforme o artigo 187 do Código Civil. As partes prejudicadas podem se valer de mecanismos como a reconvenção, o pedido contraposto ou a ação autônoma contra o advogado para garantir a devida reparação. O sistema jurídico brasileiro oferece instrumentos eficazes para coibir essas práticas e proteger a integridade do processo judicial.

Referências Bibliográficas

BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A Garantia do Contraditório na Atividade de Instrução. Revista de Processo, vol. 35, 1984.

MITIDIERO, Daniel. Antecipação de Tutela. 5ª ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2022.

MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela da Urgência e Tutela da Evidência. 4ª ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021.

SCHREIBER, Anderson. A Proibição de Comportamento Contraditório: Tutela de Confiança e Venire Contra Factum Proprium. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2017.

Código Civil Brasileiro. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

Código de Processo Civil Brasileiro. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015.

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Estatuto da Advocacia e da OAB. Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994.

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